Não caia nesta "Armadilha"
Feito para alavancar a carreira da filha cantora do cineasta, novo filme de M. Night Shyamalan é um dos piores do ano.
Você pode gostar de “Armadilha”, que estreia nos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (8).
Para isso, basta nunca ter passado perto de um show de música pop, nunca ter visto um filme na vida e nunca ter lido um parágrafo de um autor que sabe unir sujeito e predicado.
O novo filme de M. Night Shyamalan requer essas habilidades para ser desfrutado: é uma trama completamente inverossímil que os cinemas deveriam devolver o dinheiro do ingresso, pagar o estacionamento e liberar pipoca de maneira vitalícia.
A premissa é até bacana. Nem sei dizer se tem spoiler, porque não há nenhuma novidade no filme.
Josh Hartnett, em uma atuação que honra “Pearl Harbor”, faz Cooper Adams, aparentemente um dedicado pai acompanhando a filha (Ariel Donoghue) ao show da sua popstar preferida, Lady Raven (Saleka Night Shyamalan, filha do cineasta que tem uma carreira como cantora e, provavelmente, não terá como atriz). No Tanaka Arena, lugar do concerto, logo descobrimos (ou somos lembrados) que Cooper é o assassino em série chamado de “Açougueiro” (sim, muito criativo) e que todo o show não passa de uma grande armadilha planejada pelo FBI para capturá-lo.
A história é inspirada numa operação orquestrada em 1985, em Washington, com o objetivo de capturar fugitivos da lei ao atraí-los para um jogo grátis da NFL com a possibilidade de ingressos para o Super Bowl. 101 pessoas foram presas na brincadeira.
Certamente porque a polícia de Washington não fez como a do filme e contou os detalhes inteiros da operação para um vendedor de camisas tagarela (Jonathan Langdon), que explica, nos mínimos detalhes, a situação para Cooper assim que ele nota a presença em massa da polícia na arena. Mais fácil, impossível.
Tudo em “Armadilha” é feito para o espectador não pensar. Podia se chamar “Exposição - O Filme”. Cada movimento sai mastigado e explicado como se fosse uma aula de terceira série. O assassino precisa descobrir o que está acontecendo? O vendedor explica. O assassino precisa saber os planos das autoridades? Uma reunião de policiais em que ele se infiltra na maior facilidade explica. Ele precisa ir para os bastidores? Nada como um alçapão que surge na sua frente.
O filme não apresenta dificuldade alguma para o protagonista malvadão. Como se não bastasse, nada no concerto é real. Tem mais gente andando nos corredores do ginásio do que na plateia vendo Lady Raven. Seria até justificado, já que as canções são vergonhosamente derivativas. Mas não é a realidade -e nem vou entrar no mérito de um show deste nível começar e terminar sob a luz do dia, porque seria um exagero.
Você quase consegue enxergar a caneta de Shyamalan nas resoluções, algo que ele não costumava fazer. É como se existisse uma fada madrinha que realizasse o desejo de Cooper em cada desafio do personagem: ele empurra garotinhas escada abaixo no meio da multidão e nada acontece, queima outra com óleo quente e nada acontece, rouba walkie-talkies com facilidade e nada acontece, trafega tranquilo pela plateia ao largar a filha uma dezena de vezes e passa a mão em crachás de acesso sem que nada aconteça.
Ele consegue até virar BFF do tio de Lady Raven (!), vivido por… M. Night Shyamalan, que virou a bandeira do nepotismo em Hollywood, bancando a estreia da filha Ishana como diretora de cinema em “Os Observadores e, agora, tentando alavancar a carreira de Saleka na música -as duas já tinham colaborado com o pai na série “Servant”, do Apple TV+.
Shyamalan, mesmo nos seus piores momentos, apresentava construção de tensão e ângulos empolgantes de câmera. Em “Armadilha”, o visual é pobre e mundano, mesmo quando ele finalmente sai do show e parte para o mundo real. E, por incrível que pareça, tudo fica ainda mais idiota e difícil de comprar. A descrença precisa pegar um foguete para ficar suspensa.
A grande reviravolta aqui é que “Armadilha” é óbvio até à medula e uma ofensa à inteligência do espectador.
Não é por acaso que o longa foi escondido dos críticos, numa tática tão antiga quanto ineficiente.
A notícia ruim para o estúdio? Com o “C+” do CinemaScore, levantamento feito com o público após as sessões, espectadores e crítica estão juntos na desgraça:
“Armadilha” faz jus ao seu nome.
Assim como o Shyamalan atual, o final da newsletter não traz nenhuma surpresa.
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Acho q ele tá precisando devum psicanalista. O inconsciente dele tá gritando até no título.
Qual foi o último filme realmente bom dele? Sinais? Desde então ele parece ter virado uma versão B dele mesmo.