Deixa pra lá, não importa.
De Dua Lipa nos guiando pelo bairro à história do Lollapalooza nos anos 90, não falta música entre as novidades do streaming.
Nesta edição:
Música para todos os lados no streaming.
Nova série da Netflix mistura bonecos e crimes.
Histórias tenebrosas da verdadeira Hollywood.
Novo filme da HBO traz atuação magistral.
Música da semana.
Nos últimos dias, o streaming despejou uma enxurrada de programas musicais.
Não é coincidência. Documentários ou séries sobre música são baratos e vêm com uma legião de fãs. Em tempos de crise, uma combinação perfeita.
Se for seu caso, separe o fim de semana para algumas novidades que vão do pop extremo à cena alternativa de um famoso bairro de Londres.
“Gaga Chromatica Ball” é o filme do show comandado por Lady Gaga aqui no estádio dos Dodgers, em 2022. É dirigido, estrelado e criado pela popstar, mas não passa de uma peça promocional de luxo para avisar aos fãs que a cantora está com um álbum novo no forno.
Próximo.
Dua Lipa teve outro plano.
Decidiu coproduzir uma minissérie em quatro partes para o Hulu (Star+/Disney+) chamada “Camden”, que mistura um pouco da vida da popstar com a história do bairro londrino que é um dos epicentros culturais do planeta. A química é um pouco confusa, muito por causa da edição alternando entre Kosovo, onde a cantora passou parte da infância, e Londres, lar do tema central com depoimentos de dezenas de outros artistas que pouco têm a ver com Dua Lipa.
Meio higienizado para quem conhece o local e pouco interessado em suas raízes históricas, “Camden” é um retrato superficial e idílico do berço do punk e de outros movimentos de contracultura. Ainda assim, traz uma nostalgia aconchegante para quem andou naquelas ruas sujas, comprou CD pirata e camisas alternativas no mercadinho local, bebeu nos bares e viu diversos shows de bandas que ganhariam o globo em seguida.
O longa de Frank Marshall e Thom Zimny sobre o início da carreira do Beach Boys também não escapa dos erros. A obra entrou na programação da Disney+, na última sexta (24), se autopromovendo com uma recente reunião dos integrantes vivos do grupo californiano.
Imensa balela.
O encontro em Paradise Cove, onde tem um bar/restaurante à beira do mar bem bacana de se visitar para quem estiver por estas bandas da Califórnia, dura alguns segundos, não tem nenhum diálogo e suas cenas podem ser vistas em noticiários sobre o filme.
O que chega a ser triste, já que a produção é bacana e focada na fase feliz dos homens de Brian Wilson e Mike Love, mostrando mais a importância da sua música e menos os problemas que já adornaram outros filmes, como a saúde mental do seu líder e as tretas por grana.
A música, pelo menos, impera lindamente. E ainda há entrevistas novas, em separado, com Love e outros personagens importantes.
Já a Amazon Prime Video, há algumas semanas, jogou meio sem muito estardalhaço um filme dividido em dois (a nova moda no gênero?) sobre Paul Simon.
Na superfície, “In Restless Dreams: The Music of Paul Simon” captura o processo de criação de “Seven Psalms”, álbum de Paul Simon lançado em 2023.
Mas o premiadíssimo diretor Alex Gibney, voltando a ter um músico como objeto de estudo pela primeira vez desde “Sinatra: All or Nothing at All”, encontra um músico fragilizado pela perda parcial da audição e termina mergulhando na sua história, mesmo que não seja uma tão incomum assim.
Contudo, como um bom adolescente dos anos 90, nada é mais atraente que “LOLLA: A História do Lollapalooza”, minissérie em três partes que está disponível na Paramount+ sobre, como título obviamente entrega, um dos festivais mais famosos do planeta.
Dirigida por Michael John Warren, de “Jay-Z: Fade To Black”, a série de três horas resgata a origem subversiva do Lollapalooza, um evento que, ao contrário da imensa maioria dos festivais de música da atualidade, inclusive do próprio Lolla, era o programa certo que estava no local certo um pouco antes da hora certa.
Criado para ser uma espécie de despedida precoce do Jane’s Addiction, grupo amado pelos músicos da cena do fim dos anos 80 e início dos 90, mas que não deu o passo adiante rumo ao mainstream, o festival reuniu artistas alternativos em uma espécie de circo bizarro itinerante pelos EUA.
Era uma ousada impensável. Uma insanidade quase. Não havia essa mentalidade de festivais assim naquela época, muito menos nos EUA. Festival de rock era sinônimo de Europa, mais especificamente Inglaterra.
Que se dane. Quatro caras decidiram bancar a loucura. E a aposta vingou.
O primeiro Lolla, em 1991, trouxe o reggae-jazz-funk-maluquete do Fishbone, os discursos hardcore da Rollins Band, o psicodelismo-distorcido-anárquico do Butthole Surfers, o rap-metal polêmico do Body Count, o Nine Inch Nails na gestação do álbum de estreia, Living Colour no que deve ter sido o auge da sua popularidade e a convidada internacional da Siouxsie and the Banshees.
Isso tudo pouco antes do estouro de “Nevermind”, do Nirvana, e, consequentemente, do grunge. Os dois, logo, se encontraram, claro.
Algo se formava no horizonte. Uma insatisfação crescente. Era uma época cheia de problemas, mas, por alguma razão, o Lolla exibia uma gama representativa de artistas negros antes mesmo de adotar o hip-hop como chamariz popular. E nenhuma confusão por causa disso. Ainda refletia o machismo do rock com poucas artistas femininas, mas trazia Babes in Toyland, L7 e Lush na seleção.
O festival refletiu a saída da juventude da caretice dos anos 80, o cansaço com a política mainstream e a busca pelo original. No início, teve sua parcela de sorte. Grupos como Pearl Jam e Red Hot Chili Peppers assinaram contratos com a organização antes de estourarem para o mundo, em 1992.
Uma das partes mais engraçadas da série é dedicada exatamente ao Pearl Jam, o mais longevo dos supergrupos do grunge. Com “Ten”, disco de estreia da banda, virando o xodó dos roqueiros, boa parte do público começou a ficar presa no trânsito, já que Eddie Vedder e Cia. se apresentavam no início do dia, mesmo aos poucos se tornando uma das maiores atrações do mundo. Algum entrevistado manda a real com outras palavras: “O Pearl Jam jogou os holofotes no Lollapalooza”.
“LOLLA” glamouriza até dizer basta o papel de Perry Farrell, líder do Jane’s Addiction, cofundador do festival, entrevistado e coprodutor da série. E não entra em muitos detalhes sobre a decadência da marca no início dos anos 2000, preferindo focar a ressurgência como um festival mais tradicional, com base em Chicago.
Ainda assim, “LOLLA: A História do Lollapalooza” utiliza o arsenal do arquivo da MTV, que faz parte do grupo proprietário da Paramount+, para deixar qualquer fã de música sorrindo com suas camisas de flanela.
Meus momentos preferidos:
Cenas do primeiro show do NIN no festival, quando o grupo precisou parar de tocar porque o calor havia quebrado seu equipamento da base eletrônica. Eles quebram tudo que encontram pela frente, mesmo sem ter grana para comprar outros -Trent Reznor, inclusive, é um dos principais entrevistados e tem as melhores falas.
Ice-T e seu Body Count tocando com Perry Farrell o cover de “Don't Call Me Nigger, Whitey”, de Sly & the Family Stone. Histórico.
Soundgarden mandando uma versão ao vivo que eu nunca tinha ouvido de “Cop Killer”, música do Body Count que foi motivo de censura nos EUA.
A relação do Rage Against The Machine com o festival e o famoso protesto dos peladões.
A mudança no college rock americano se tornando visível com a entrada trepidante do Pavement, Sonic Youth, Beck e Elastica no Lolla de 1995. Há uma cena com o grupo de Stephen Malkmus sendo expulso do palco sob uma chuva de garrafas e lama.
Chance The Rapper confessando como pulou a cerca para entrar no Lolla de Chicago e, anos depois, virou uma das principais atrações na sua cidade natal.
O primeiro show de Lady Gaga novinha ainda sem ser Lady Gaga num dos menores palcos do festival já em Chicago -e sua volta, já no palco principal.
Uma viagem no tempo deliciosa e barulhenta.
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