"Guerra Civil" é cinema chocante, espetacular e tenso
Filme com Wagner Moura em grande papel imagina os Estados Unidos divididos por um governo autoritário e antidemocrático.
Uma das principais perguntas feitas pela imprensa norte-americana ao elenco e diretor de “Guerra Civil” é sobre a possibilidade de o filme servir de inspiração para atos parecidos de insurreição.
Nele, o presidente dos EUA com três mandatos e síndrome de ditador vivido pelo camaleônico Nick Offerman (“The Last of Us”) decreta guerra contra seus próprios conterrâneos -subdivididos em “Forças do Oeste” (Texas e Califórnia), Aliança da Flórida, Novo Exército Popular (estados do noroeste) e Estados Legalistas (centro-oeste e parte da costa leste).
O mapa está abaixo para facilitar:
Fico me perguntando onde estavam estes mesmos questionadores em 6 de janeiro de 2021, quando uma turba de apoiadores do presidente derrotado democraticamente Donald Trump invadiu o Capitólio em um dos episódios mais chocantes da política interna norte-americana. Muitos não aceitaram a derrota do seu mestre, incentivados pelo próprio, que agora enfrenta processos legais, mas parece novamente capaz de retomar o poder (democraticamente) em ano de eleição.
Dirigido por Alex Garland (“Ex Machina”), “Guerra Civil”, que estreia nos cinemas brasileiros em 18 de abril, não serve de inspiração para terroristas domésticos e antidemocráticos, porque eles já existem, atacaram instituições governamentais, aparecem na mídia de ultradireita sem a menor desfaçatez e promovem a ideia de uma nova secessão há décadas.
Seria como culpar John Milius por “Amanhecer Violento” (1984), que imagina uma invasão soviética aos EUA durante a guerra fria, ou a recente série norueguesa “Occupied” (Netflix), sobre os russos dominando a Noruega para manter o fluxo de combustível fóssil, caso Putin decida ir além nos seus planos de expansão.
Martyn Burke e Joe Dante já tinham pensado na possibilidade de tumultos internos norte-americanos, mas de forma satírica em “The Second Civil War” (HBO), comédia de 1997 que potencializa a presença da imigração nos EUA e a reação à ela. Na HQ “DMZ” (que virou uma péssima minissérie da HBO, em 2022), o roteirista Brian Wood criou algo mais próximo do pensado por Garland ao colocar dois exércitos norte-americanos em batalha pelo poder no próprio solo dos EUA, respeitando apenas Manhattan como zona desmilitarizada (DMZ).
“Guerra Civil” não inspira o perigo. O filme respira o perigo. É movido por ele.