"Os Anéis de Poder" é a ponte perfeita entre os filmes de Jackson e a literatura de Tolkien
A série mais cara de todos os tempos mostra uma escala comparável apenas aos blockbusters hollywoodianos.
Cinco anos depois de ter adquirido os direitos para a televisão de “O Hobbit” e “O Senhor dos Anéis”, o Prime Video, serviço de streaming da trilionária Amazon, finalmente estreia os dois primeiros episódios de “O Senhor dos Anéis: Os Anéis de Poder”, nesta quinta-feira (1º), às 22h (horário de Brasília).
Apesar de levar o nome “O Senhor dos Anéis”, a série não é uma nova adaptação da trilogia escrita por J.R.R. Tolkien e filmada por Peter Jackson em três longas entre 2001 e 2003. Na verdade, ela se passa milhares de anos antes da caminhada de Frodo Baggins à Montanha da Perdição: é baseada em notas de apêndices, árvores genealógicas, canções e relatos breves contidos nestes livros sobre o que o autor batizou de Segunda Era da Terra-Média.
A relativamente pacífica Segunda Era da Terra-Média foi a menos explorada por Tolkien em seus livros, mesmo na obra póstuma “O Silmarillion”, a qual traz os principais textos sobre esse período e claramente adorna a série do Prime Video.
“Mas os direitos não eram de ‘O Senhor dos Anéis’ e ‘O Hobbit’?”, você poderia me perguntar.
Sim. Explico.
Christopher Tolkien (1924-2020), terceiro filho de J.R.R. Tolkien, era o principal editor dos livros e executor do espólio do pai. Assim como ele, desprezava qualquer adaptação das obras para o cinema (ou televisão, neste caso). Em agosto de 2017, ele se afastou da direção da entidade e, coincidentemente (?), em novembro daquele ano, a Amazon conseguiu uma inédita colaboração com o espólio do escritor britânico, que recebeu US$ 250 milhões em troca dos direitos citados.
Como a trama de “O Senhor dos Anéis” se passa na Terceira Era da Terra-Média, não é preciso ser gênio para imaginar que essa parceria com o espólio tenha sido vital para a série existir na Segunda Era e até mesmo trazer um prólogo passado na Primeira Era da Terra-Média.
Sem a colaboração de quem manda em “O Silmarillion” ou outras obras, como “Contos Inacabados de Númenor e da Terra Média” ou “The History of Middle-Earth” (volumes inéditos no Brasil), que trazem detalhes das primeiras Eras da Terra-Média, a Amazon poderia virar facilmente alvo de um processo bilionário.
Afinal, eles basicamente estão fazendo uma série baseada em trechos de “O Senhor dos Anéis”, mas que guardam muito mais semelhança com “O Silmarillion”, obra que Tolkien escrevia com tanto carinho que nunca conseguiu acabá-la.
Grosso modo, seria algo como se a DC vendesse os direitos da história de um policial de Gotham City para a Disney, e a Marvel decidisse fazer um filme do Batman a partir disso.
Mas todo o esforço e dinheiro valeram a pena.
“Os Anéis de Poder” é um marco da televisão, uma série de escala tão rica e grandiosa que só pode ser comparada a grandes filmes hollywoodianos. Dos efeitos especiais quase perfeitos (alguns em computação gráfica, outros em técnicas antigas de câmeras) à dramaturgia, tudo na série é impressionantemente bem realizado.
Nos dois (de oito) episódios liberados para a imprensa, somos apresentados com calma a seus protagonistas iniciais:
A elfa Galadriel (Morfydd Clark), milhares de anos antes de se tornar a senhora da Lothlórien, busca vingança contra Sauron depois da morte do seu irmão, Finrod. Mesmo indo contra a vontade do Alto-Rei Gil-Galad (Benjamin Walker), que comanda do alto do seu trono em Lindon, a comandante dos exércitos do norte renuncia à vida em Valinor, a terra sagrada, para caçar Sauron, apesar da última aparição do vilão ter sido relatada séculos atrás.
Nori (Markella Kavenagh) e Papoula (Megan Richards), hobbits pés-peludos, nômades e ancestrais de Bilbo e Frodo, que desejam ver o mundo, mas tomam um choque de realidade ao encontrarem um Estranho homem que “caiu do céu” (Daniel Weyman) e fala com vagalumes (hmmm).
Arondir (Ismael Cruz Córdova), um elfo silvestre que vigia Tirharad, a terra dos homens, há 79 anos, desde que o mal de Morgoth foi totalmente erradicado. Ele faz parte da guarda da torre de Ostirith, que será desativada para alívio dos elfos, que poderão voltar para suas regiões de origem, e para os homens, que ainda carregam preconceito e corrupção em seus corações.
Mas a situação complica quando ele se apaixona por Bronwyn (Nazanin Boniadi), uma humana curandeira, situação que normalmente na obra de Tolkien termina em tragédia -os dois personagens foram criados para a série inspirados, possivelmente, no conto de Beren e Lúthien.
O meio-elfo Elrond (Robert Aramayo), vivido nos filmes por Hugo Weaving, está longe de ser o guerreiro que comanda Rivendell, mas ainda é um jovem político que vai ajudar Celebrimbor (Charles Edwards), o maior dos artesãos élficos ainda em atividade, a erguer uma forja monumental -para quem não sabe, ele é manipulado por Sauron a forjar os Anéis de Poder, mas isso não deve acontecer na primeira temporada.
Para isso acontecer, Elrond vai ao impressionante reino-anão de Khazad-Dûm, que conhecemos nos filmes em ruínas como Minas Moria, para reatar a amizade com o príncipe Durin IV (Owain Arthur) para um intercâmbio de matéria-prima. O que ele não sabe é que os anões acabaram de descobrir um filão de um metal poderoso que conheceremos no futuro como mithril, algo que pode significar a derrocada daquele reino, como bem sabemos.
O outro núcleo principal de “Os Anéis de Poder” não aparece até o terceiro episódio: Númenor, a ilha habitada por humanos agraciados com longa vida pelos deuses Valar, uma recompensa por sua ajuda contra Morgoth -novamente, isso é outra história.
Chegamos à Númenor depois de Galadriel pular do barco que a levava a Valinor e ser resgatada dos Mares Divisores por um grupo de refugiados humanos, entre eles o charmoso Halbrand (Charlie Vickers).
Na ilha, conhecemos as versões mais jovens de rostos lendários, como Elendil (Lloyd Owen), homem que fundará Gondor, e seu filho, Isildur (Maxim Baldry), que, no futuro, derrotará Sauron e poderia ter destruído o Um Anel. E também novas faces, como Míriel (Cynthia Addai-Robinson), a rainha-regente de Númenor que pode pagar um preço alto por confiar em Pharazôn (Tristan Gravelle), seu conselheiro.
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