"True Detective: Night Country" volta ao horror das suas origens
Quarta temporada é a primeira sem o criador Nic Pizzolatto e leva Jodie Foster e Kali Reis para um Alasca sombrio.
Nesta edição:
Entrevista com as mentes por trás da nova temporada de “True Detective”.
A crítica de “True Detective: Night Country”.
Papo exclusivo em vídeo com J.A. Bayona, diretor de “Sociedade da Neve”.
Nova comédia para fugir nos cinemas.
Série documental imperdível mergulha de forma obsessiva em um dos maiores filmes do cinema pop.
Música(s) da semana
Quando a HBO procurou a diretora e roteirista Issa López (“Os Tigres Não Têm Medo”) para ressuscitar a série de antologia “True Detective”, que não via a luz do dia desde 2019, os executivos perguntaram o que ela faria caso fosse contratada.
A cineasta mexicana foi direta.
“Não faço a mínima ideia”, disse López. “Mas tenho algumas ideias”.
A principal delas era o resgate do tom de horror sobrenatural que tanto chamou a atenção na primeira temporada, lançada em janeiro de 2014.
Era a resposta que os executivos queriam ouvir.
“Havia algo naquele sul gótico que permanece com a gente. Algo em relação àqueles dois personagens tão opostos em um mundo que era um personagem à parte, um cenário onde tudo poderia acontecer”, conta à diretora em entrevista para a imprensa mundial em Los Angeles. “Mantive as personagens, o cenário baseado num canto dos EUA que não vemos normalmente e criei duas detetives resolvendo um caso sinistro neste lugar desolado que é um personagem em si. E assim ‘Night Country’ nasceu.”
Uma mistura de “30 Dias de Noite”, “Terror na Antártida” e “Mare of Easttown”, “True Detective: Night Country”, que estreia na HBO em 14 de janeiro, marca também a volta de Jodie Foster a um papel fixo na televisão, algo que não acontecia desde 1975, antes mesmo da atriz aparecer como uma prostituta adolescente em “Taxi Driver”, de Martin Scorsese, aos 12 anos, e virar estrela.
Mas o primeiro encontro não foi fácil.
“Você foi assustadora”, dispara López para Foster, sentada ao seu lado. “Sim, fui. Falei algumas coisas aterrorizantes das quais não gostava no roteiro, e sai da cidade”, confirma a atriz, contrastando com sua famosa delicadeza e suavidade. “Precisei pensar rápido, porque ela falou que não se via no projeto, mesmo tendo amado o roteiro”, explica a diretora. “Jodie comecou a falar de uma personagem cheia de defeitos e, quando terminei de ouvir, eu questionei: ‘Você quer que ela seja uma cuzona?’ Ela respondeu que sim, então fui em frente e escrevi uma cuzona. Uma linda cuzona com um bocado de esperança no coração.”
A “cuzona” é Liz Danvers, uma mulher de zero tato social, workaholic e que não acredita muito na instituição casamento (dos outros) que foi punida, após um caso mal resolvido, com uma “promoção”: virou chefe de polícia de Ennis, uma cidade nos confins do Alasca. A mesma missão desastrosa que levou Danvers à função, jogou sua ex-parceira, Evangeline Navarro (Kali Reis), para a pouco respeitada polícia estadual.
As duas detetives voltam a se encontrar em meio ao período do inverno do fim do ano, quando Ennis é engolfada pela noite contínua por mais de um mês. É nesta escuridão que membros de uma estranha estação de pesquisas científicas aparecem mortos na neve, congelados e com expressão de pavor em seus rostos petrificados.
Como na primeira temporada, “True Detective” passa a especular o envolvimento de forças sobrenaturais Lovecraftianas, agora baseadas em lendas nativas do Alasca. Danvers é a cética. Navarro é a respeitosa em relação ao que existe “lá fora” e suas raízes nativas.
“Uma das coisas que adorei na temporada de estreia foi como ela tocava sutilmente nesta mitologia. Havia Carcosa e o Rei de Amarelo. Era insano como este mistério de assassinato tão real tinha uma pitada de terror cósmico. E eu queria mais disso”, lembra López, que revela ter devorado clássicos da literatura gótica desde pequena. “Falei para a HBO que traria de volta o elemento de horror, então há um pouco disto em ‘Night Country’. Um pouco da sensação de que há coisas mais antigas que as estrelas que o gelo esconde. Se você quiser acreditar nisso, claro. Se não quiser, é um quem-matou-quem no gelo.”
Para conseguir simular a situação de noite eterna no Alasca, López levou as filmagens para a Islândia, onde teve o clima ideal gelado, mas a infraestrutura necessária para manter a equipe inteira por meses. “A Islândia tem uma comida excelente”, diz Reis, uma descendente de Wampanoag, povo que habitava o nordeste dos Estados Unidos, e Cabo Verde, que ficou conhecida como boxeadora, mas ganhou fama dramática pelo papel no filme “Infiltrada: Golpe de Vingança”, de 2021. “Filmar lá foi uma bênção. Era economicamente certo, tínhamos uma boa equipe, energia ao nosso redor, todo mundo era amigável e a escuridão… Quer dizer, estávamos filmando e eu ficava olhando para a Aurora Boreal.”
“Sou mexicana, então não estava preparada. Mas o que posso fazer? A culpa é toda minha, que escrevi a série”, diverte-se Issa López. “Acho que fui um pouco presunçosa, querendo entregar algo inesperado. Consegui o que queria e terminamos lá. Mas foi lindo. Teria sido completamente diferente se tivéssemos filmado no estúdio como se faz hoje em dia, com uma tela de LED ao fundo. Estávamos lá, no gelo. E isso afetou a história que contamos da melhor maneira possível.”
“Sim, tivemos desafios enormes, principalmente filmando à noite. Estranhamente, meio que estávamos com os deuses do nosso lado”, completa Foster. “Quando precisávamos de neve, nevava. Quando precisávamos de um clima mais ameno, era uma calmaria.”
Preocupada com a autenticidade, a produção levou dois nativos do Alasca para acompanhar as filmagens com consultores. Já Jodie Foster e Kali Reis passaram parte do verão no Alasca. “Adoro a Islândia, mas o Alasca é um lugar mágico, onde você sente a natureza de verdade e a conexão de todos com ela”, afirma Foster. “E há o elemento de sobrevivência, a dor que acompanha isso, algo que atrai as pessoas ao lugar.”
O resultado de tamanho esforço valeu a pena?
Tive acesso aos seis episódios que formam “True Detective: Night Country”, numa ação rara da HBO em relação a um dos seus produtos mais prestigiados.
Sem spoilers.