Vale a pena esconder um filme?
Os estúdios estão cada vez mais apelando para "influenciadores" para controlar sua narrativa. Dará certo para "Besouro Azul"?
Nesta edição:
“Besouro Azul”: valeu a pena esconder?
Como é assistir a um show nas Red Rocks.
Dupla de “The Bear” em filme indie.
Cachorros fofinhos com boca suja.
O amor nas profundezas do mar.
Música da semana.
No início do mês, o jornal britânico “The Guardian” publicou um artigo opinativo intitulado “Quem precisa de críticos de cinema quando os estúdios têm certeza de que os influencers elogiarão seus filmes?”
Eu estava com a aba do texto de Manuela Lazic aberta no meu computador havia algum tempo. A ideia de escrever algo sobre a popularização de “influencers” já estava na minha mente desde antes da pandemia.
No entanto, não queria soar azedo ou magoado com novas mídias. Sempre encarei isso com normalidade. Picaretas disfarçados de jornalistas existem em papel, na TV ou no TikTok.
Ao longo da minha carreira de 25 anos na área, já conheci “repórteres” que compravam fitas com entrevistas para publicá-las com sua assinatura, plagiadores descarados, puxa-sacos em busca de fama por tabela, textos completamente fabricados e “exclusivas” que vinham de coletivas de imprensa.
Isso não mudaria com a chegada de “influenciadores”, muitos que não sem qualquer ligação jornalística e sua formação ética.
Muitos não sabem, mas os “influenciadores” mais famosos possuem agentes e networks que servem de meio de campo entre uma empresa e eles.
Funciona mais ou menos assim: empresa quer divulgar um produto X (algo que pode ir de filmes a restaurantes), procura a network e estabelece seu orçamento de publicidade. A agência divide esse orçamento entre os “influenciadores” da sua rede ou contrata o “influenciador” específico da sua rede. Eles recebem instruções determinadas pela empresa para as postagens.
Tudo lindo, tudo sai como a empresa deseja. E o melhor: parece realmente natural.
Hoje em dia, há regras para tentar minimizar esse borrão entre publi e opinião real. Influenciadores, em tese, precisam deixar claro que estão recebendo para publicar certas coisas.
Acredite, isso nem sempre acontece -muitos trocam postagens por produtos, fazem elogios e não deixam claro que ganharam aquilo de graça para postar.
O que noto com “influenciadores” é que tudo isso vira um grande borrão. E que tudo é lindo, maravilhoso, incrível. Mas não tem muito conteúdo ou lado ruim. É o jornalismo Instagram. As entrevistas são superficiais (hoje, menos de cinco minutos), rápidas, editadas ao extremo e focadas em piadinhas.
Antes da pandemia, os dois estilos eram bem divididos e procurados pelos estúdios, que costumavam entender a importância de criar público a longo prazo. Hoje em dia, esquece.
Até entendo o lado dos estúdios. No lugar de um executivo lutando por um emprego de alto salário, eu talvez preferisse apelar para entrevistas que destacassem apenas o lado bom dos filmes, não se aprofundassem em outros temas e que ganhasse milhões de visualizações com brincadeiras infantis.
Se isso se reflete nas bilheterias atuais, não sei.
Mas se reflete bastante em como os estúdios estão perigosamente flertando com o obscurantismo, escondendo filmes da imprensa ou adiando o máximo possível.
Eles querem ter o controle total da narrativa, como se isso fosse mudar o desempenho de um projeto nos cinemas.
Já notava isso com a Sony, que desistiu de mostrar seus filmes para a crítica aqui em Hollywood.
Agora foi uma história bizarra que tive com a Warner Discovery e “Besouro Azul”, que estreou nesta semana nos cinemas.